Anos 20


MEU PRIMEIRO DIA DE AULA
                                             Cecília Duarte Fogaça  (trechos do livro Vivendo)

          
Em meu primeiro dia de aula papai levou-me até o portão do Grupo Escolar. Lá estavam algumas meninas e papai recomendou a elas para que me orientassem lá dentro e mostrassem a classe para onde eu deveria ir. Foi fácil, logo encontrei tudo.
Uma professora formou a fila do primeiro ano e as outras formaram as filas das outras séries. O meu primeiro dia foi diferente de todos os outros dias. Chegando à escola, fiquei “pasmada” com tantas meninas. Nunca tinha visto tantas juntas.Brincavam de roda, pulavam corda, jogavam amarelinha. Eu não conhecia ninguém e me senti estranha.
Gostei muito de D. Nicota, minha professora. Era uma mulher bonita, alta, morena clara com cabelos negros. Muito risonha, tratava os alunos com o maior carinho. Ela me pôs sentada com uma menina chamada Ednir.
Mamãe mandou fazer meu uniforme. Era de escoteira – brim cáqui, saia pregueada e comprida até os joelhos, blusa de mangas compridas, lenço verde no pescoço. O chapéu e os sapatos eram pretos. Eu não gostava porque o achava  muito quente, mas o ano todo tive que usá-lo.   
O Grupo Escolar de Itararé era grande e tinha o pátio interno dividido ao meio, separado em duas alas. Metade era para as meninas e a outra, para os meninos, lá no outro lado.Quando se abria o portão desse muro era aquele barulhão dos meninos brincando em seu pátio. A gente queria olhar os meninos lá no outro lado. Só olhar, porque os meninos e meninas viviam separados, sem nenhuma comunicação.
No meu tempo de escola as carteiras eram bem maiores, feitas para duas crianças. Em sua parte dianteira, chamada mesinha, havia um pequeno buraco redondo bem no centro, onde ficava o tinteiro. Este era de vidro, ficava embutido na madeira e era coberto por uma tampa de metal que as crianças gostavam de lustrar com uma flanelinha para ficar brilhante. A aluna pegava a caneta de madeira e molhava a pena de metal no tinteiro para escrever. Se molhava demais, fazia borrões no caderno e ficava horrível. Usava o mata-borrão para secar a tinta, mas as manchas já estavam feitas e lá ficavam. Algumas vezes faltava tinta na escola e cada aluna levava seu tinteiro de casa. Era uma sujeira! As meninas derrubavam tinta nas roupas, nas mãos, no chão. Era aquela bagunça. A professora ficava brava e punha as meninas de castigo, de pé, lá na frente da classe. Era uma humilhação e elas choravam.
 Hoje é tudo diferente, tudo limpinho, as canetas já vêm com tinta. A sujeira e os castigos são coisas do passado. Apesar disso tudo, eu adorava a escola. Sentia-me feliz, D. Nicota gostava de mim e achava que eu era boa aluna. Lia bem a lição, fazia contas no quadro e só tirava doze, que era a maior nota.
Chegou o final do ano e eu tinha que fazer exames para passar de ano, mas não estava preocupada porque sabia tudo. A professora corrigiu as provas e no final da semana deu o resultado. Para mim foi uma grande felicidade quando ela disse:
-  Muito bem, Cecília! Você tirou a maior nota da classe. Vai ganhar um prêmio por ter sido a melhor aluna durante o ano todo.
Voltei para casa muito alegre. Mamãe, como de costume, estava me esperando na caixa d”água. Fui ao seu encontro gritando de alegria.
- Tirei a maior nota da classe e ganhei um prêmio que vou receber no dia da festa, no fim do mês. –mamãe abraçou-se contente. Chegando em casa, contamos meu grande feito para papai e vovó que quiseram festejar. À noite ele tocou sanfona e vovó dançou sozinha, de tanta alegria.
Eu morava numa chácara distante da cidade que acabava antes da caixa d’água antiga. Morar na chácara era um sacrifício, pois ficava muito longe, perto da Igreja do Divino onde só havia mato. Para ir à escola era preciso  uma pessoa adulta levar-me até a caixa d’água e ficar esperando até eu entrar na cidade. A estrada tinha mato dos dois lados, era deserta, e meus pais tinham medo de mandar-me sozinha, pois por ali passavam boiadas. Todos os dias tinham o trabalho de levar-me e, na volta, ficar  esperando no mesmo lugar. A partir da caixa d’água eu podia ir sozinha porque se aparecesse uma boiada era só eu correr para a casa mais próxima.
Sentía-me importante por fazer sozinha o resto do trajeto. Caminhava uns 100 metros pelas rua das Tropas, que nesse trecho era apenas um caminho com sulcos de carroça entre a grama. Então descia mais um pouco e seguia por uma trilha que levava para algumas chácaras. Passava, então, na chácara de alguma coleguinha  e íamos juntas para a escola. E assim foi o ano todo.
Terminadas as férias, voltei para a escola, mas agora no 2º ano. D.Maricota, a professora, era muito brava. Era esposa do diretor da escola, o professor Tomé Teixeira, que deu nome ao primeiro grupo escolar de Itararé. Eu tinha um pouco de medo dela...
Uma vez por semana havia um ensaio de músicas no salão de festas e as professoras reuniam as alunas para que o “Seu Peppo”, o porteiro italiano da escola, lhes ensinasse músicas patrióticas. “Seu Peppo” era um grande artista e sabia fazer um pouco de tudo. Sempre alegre e brincalhão, era muito querido por todos.
No salão havia um grande piano escuro; a professora Filomena Melillo tocava e “Seu Peppo” cantava para as alunas o acompanharem: 
“Eia avante colegas a escola
É o caminho que à glória conduz,
O saber que do livro se evola,
A grandeza da pátria traduz.

                            Cada escola que se abre é um templo,
                            Onde brilham milhares de sóis,
                             Onde o ensino se faz pelo exemplo,
                             Hoje é o livro que faz os heróis”.
                                                     
.                            _______________


  TEMPO DE ESCOLA

Maria de Lourdes Ferreira Almeida

Nasci em Itararé no dia 25 de junho de 1906. Meus pais se chamavam Antonio Ferreira Carvalho e Olívia Furquim Ferreira que tiveram oito filhos.
Fui casada com Laércio de Almeida, pessoa bastante conhecida e estimada, porque trabalhou muito pelos necessitados, tendo fundado a  entidade beneficente - “Os Vicentinos” que deu origem à Vila Vicentina.
Tivemos oito filhos: Maria Tereza, Maria do Carmo, Maria Cecília, Maria Ângela, José Roberto, Luiz Antonio, José Carlos e Laércio Junior, formando uma grande família.
Fui matriculada no Grupo Escolar Tomé Teixeira quando tinha oito anos. Lembro que achei a escola muito bonita e muito grande, com muitas crianças brincando, jogando amarelinha, brincando de roda e cantando.
Minha primeira professora foi D. Nicota, esposa do diretor Tomé Teixeira. Ela era brava. Depois fui aluna de D. Alice Ferreira Braga, que era muito boazinha e de quem eu gostava muito.
Lembro que eu tinha muitas coleguinhas com quem brincava no recreio: Antoninha Miranda, Antonieta Fonseca, Zeni Ferreira, Jandira Lobo, Mafalda Ghizzi e outras, mas não lembro mais os seus nomes.
As crianças tinham medo do porão escuro porque diziam que nele tinha assombração e o corpo seco, que era um esqueleto.
Tanto a D. Nicota como o diretor Tomé Teixeira eram muito enérgicos e todos os respeitavam.
 Tenho muita saudade do meu tempo de escola e das coleguinhas.